O Homicídio de Bich Ha Pan

Existem muitos pais restrictos por este Mundo fora. Sabemos que o que fazem é pelo bem dos seus Filhos, mesmo quando exageram na protecção, exigências e determinações. Principalmente algumas das Famílias imigrantes que passaram por várias necessidades e que, por isso, tentam transmitir às gerações seguintes que, com trabalho árduo e dedicação, não têm que passar pelo que eles passaram. Que os sacrifícios feitos hoje, dão fruto no amanhã.

Esta é a história de um casal exigente com os seus Filhos sempre com a melhor das intenções no horizonte. É a história de uma jovem que, farta de tentar corresponder às expectativas dos Pais, fez o impensável. Que, apaixonada por um rapaz e com o intuito de o reconquistar, eliminou o que pensou estar no seu caminho.

Esta é a terrível história da Família Pan

Os Pan eram uma Família simples, sossegada e trabalhadora.

Hann e Bich Ha Pan tinham crescido no Vietname e imigrado separadamente para o Canadá em 1979, como refugiados políticos. Conheceram-se em Toronto e casaram pouco depois.

Em 1986 nasceu Jennifer, a primeira Filha do casal, seguida de Felix em 1989.

Ambos tinham trabalhado numa fábrica de peças automóveis em Aurora, uma cidade a cerca de 1 hora de Toronto e viviam num bairro complicado em Scarborough, nunca perdendo de vista o objectivo de se mudarem para uma comunidade mais calma e segura.

Em 2004, conseguiram mudar-se para Markham, um bairro maioritariamente asiático, ficando perto de familiares e amigos.

No final da década de 2000, Hann conduzia um Mercedes e a sua esposa um Lexus e, apesar de em 2008 Bich Ha ter perdido o seu trabalho, devido a cortes no pessoal na fábrica, o casal continuou a fazer com que o seu estilo de vida continuasse a resultar.

Em 2010, tinham mais de 200 mil dólares no Banco, dando-lhes a possibilidade de suportar os custos dos estudos dos seus Filhos, sendo essa a prioridade do casal. Para além de pretenderem dar-lhes tudo o que não tinham tido nas suas vidas, exigiam que cada um deles desse o melhor que podia, principalmente nos estudos para que pudessem construir um futuro estável e confortável.

Aos 4 anos Jennifer começou a tocar piano e, ainda na Primária, já tinha o seu quarto cheio de prémios. Enveredou também pela patinagem artística com o objectivo de ser recrutada para a equipa dos jogos olímpicos de Inverno de 2010. Treinava até às 22h00 e, chegando a casa, estudava e fazia os seus trabalhos da escola, muitas vezes, até à meia-noite. Porém, apesar da sua dedicação e esforço, não conseguiu o recrutamento tendo ficado devastada. Os seus Pais tentaram reconfortá-la sublinhando o facto dela ter dado o melhor de si e isso era sempre o mais importante.

Fora dos estudos e actividades extra-curriculares, os Pan tinham também regras rígidas em relação aos seus Filhos. A Jennifer, por exemplo, nunca lhe foi permitido ir a festas, dormir em casa de amigas ou passar férias ou fins-de-semana com os seus colegas, muito menos namorar. Para além de a considerarem muito nova para tal, achavam que isso podia distrair Jennifer dos seus verdadeiros fins.

Porém, no final do Secundário em 2003, Jennifer pôde ir à sua viagem de finalistas, durante cerca de 2 semanas, numa visita à Europa.

Foi aqui que Jennifer e o seu amigo Daniel Wong se envolveram romanticamente mas a jovem não teve coragem de contar aos seus Pais acerca da relação.

Daniel era Filho de imigrantes asiáticos, tendo origens filipinas e chinesas. No último ano do Secundário, os seus Pais transferiram-no para a Academia Cardinal Carter, uma escola católica de artes, em Toronto. Isto porque Daniel estava a baixar drasticamente as suas notas e tinha sido acusado de tráfico de droga depois de terem sido encontrados mais de 200g de marijuana no seu carro.

Jennifer não gostava destes negócios do namorado mas Daniel avisou-a desde logo que não tinha intenções de parar mas não a envolveu no assunto.

Quando os Pan descobriram a relação entre os dois, tentaram pôr-lhe um fim mas Jennifer estava apaixonada, continuando a ver Daniel às escondidas.

Apesar de andar distraída com a sua nova paixão, as notas da jovem eram suficientemente altas para entrar de imediato na Universidade Reyrson tendo ganho uma bolsa de estudo. O seu objectivo era estudar ciências durante 2 anos naquela faculdade e posteriormente pedir transferência para a Universidade de Toronto para estudar farmacologia.

Os seus Pais, para além de terem apoiado as suas decisões, estavam radiantes com o sucesso de Jennifer. Suportavam-na financeiramente fazendo depósitos regulares na sua conta, davam-lhe boleias constantes para a faculdade e até a deixavam ficar duas vezes por semana na casa de uma colega que morava perto da Universidade para poupar Jennifer às frequentes deslocações.

Eventualmente, Hann e Bich Ha voltaram a dar conta que Jennifer mantinha a relação com Daniel proibindo-a de uma vez por todas de continuar a ver o jovem. Jennifer compreendeu a reacção dos seus Pais. Sabia que o que faziam era para o seu melhor interesse, sendo que um namoro facilmente a distraía dos seus verdadeiros fins. Prometeu-lhes terminar a relação e parar os contactos na totalidade com Daniel.

Eventualmente, conseguiu um trabalho de voluntariado no Hospital de Toronto a assistir crianças doentes o que fez com que os seus Pais irradiassem alegria.

Finalmente os Filhos do casal Pan estavam bem encaminhados para o futuro e não tardava para que o casal pudesse relaxar sem este tipo de preocupações.

Para Hann Pan, o dia 8 de Novembro de 2010, estava a ser uma segunda-feira normal. Tinha acordado às 5 da manhã, como de costume, e tinha ido trabalhar para a fábrica em Scarborough, a cerca de 30 minutos de Unnionville, Markham, onde residia.

O seu Filho mais velho, Felix, encontrava-se a estudar a cerca de meia hora dali, sendo que os Pan a viver na mesma casa, estavam reduzidos ao Pai, Mãe e Filha.

No final do seu turno, já a meio do caminho de casa, lembrou-se que não tinha trancado as suas ferramentas, voltando para trás para as trancar e fazendo-se novamente à estrada. Quando chegou a casa, pelas 16h30, contactou o seu irmão para ir com ele à Home Depot comprar alguns objectos que lhe faziam falta, regressando 2 horas depois.
Após pegar no prato que a sua esposa lhe tinha deixado preparado e de jantar sozinho, subiu ao primeiro piso e sentou-se em frente ao computador para se actualizar das notícias do seu País antes de se preparar para dormir.

Para Bich Ha, de 53 anos, também tinha sido um dia como tantos outros. Tinha ido visitar o seu Pai ao lar e tinha ficado em Markham por algumas horas a tratar de assuntos. Regressou a casa pelas 3 da tarde e, mais tarde, preparou o jantar para a Família. Chamou a sua Filha, Jennifer, de 25 anos, para que jantassem juntas antes que tivesse que sair para as suas aulas de dança como fazia todas as segundas-feiras.

Deixou o jantar do marido preparado para que Hann tivesse tudo pronto quando regressasse, conseguisse comer em paz e para, pouco depois, se deitar como fazia habitualmente. Acordava todos os dias às 5 da manhã e, portanto, tinha o costume de ser o primeiro a ir dormir.

Jennifer tinha passado o dia a treinar as suas habilidades ao piano. Tocava o instrumento desde os 4 anos de idade mas ia ter um teste brevemente e tinha que se sentir preparada. Depois de jantar com a sua Mãe e desta sair para as aulas de dança, Adrian, seu amigo de longa data, fez-lhe uma visita como habitualmente. Desceram para a cave da residência, onde a Família tinha uma sala com televisão, para assistirem a episódios de Gossip Girl e How I Met Your Mother. Depois de Adrian ir para casa, pelas 21h00, Jennifer subiu para o seu quarto no primeiro piso, ligou a televisão e deitou-se na cama a assistir ao Amazing Race.

Ouviu a sua Mãe a chegar a casa pelas 21h15, desceu as escadas, cumprimentou-a e voltou para o quarto para acabar de ver o programa de televisão. Depois, contactou o seu ex-colega de trabalho, Edward Sapiano, com quem se manteve ao telefone até ser surpreendida.

Ouviu movimentações no piso de baixo e a sua Mãe, que falava sempre em vietnamita e cantonês, balbuciava qualquer coisa em inglês. Ouviu passos pesados a subir as escadas, sabendo de imediato de não se tratar de nenhum dos seus Pais. Desligou a chamada com Edward e ficou petrificada, com demasiado medo para abrir a porta para saber o que se estava a passar ou mesmo para fazer o mais pequeno movimento.

Ouviu o seu Pai a ser arrastado para o piso principal, para junto de Bich Ha, enquanto homens lhe ordenavam aos gritos para que indicasse onde estava o dinheiro. A Esposa perguntou-lhe como é que aqueles homens tinham entrado na casa mas Hann tinha sido acordado abruptamente, estando tão surpreendido, aterrorizado e baralhado quanto ela.

Finalmente, Jennifer conseguiu abrir a porta para verificar a situação mas deparou-se com um homem de longas rastas, com uma corda e arma na mão. O homem entrou no seu quarto de rompante e amarrou-lhe as mãos atrás das costas. Disse-lhe que fizesse tudo o que lhe era pedido para que ninguém saísse dali magoado. Pediu-lhe dinheiro e Jennifer indicou onde tinha 2.000 dólares que tinha conseguido poupar.
De seguida, foi arrastada para o quarto dos seus Pais onde lhe voltaram a exigir que indicasse onde estava o dinheiro. Jennifer não fazia a menor ideia onde os Pais guardavam dinheiro, se é que existia mesmo dinheiro naquela casa.

Foi quando entrou outro homem no quarto e os dois reviraram a divisão do avesso, porém, não encontraram quaisquer valores.

Os dois levaram Jennifer para o piso de baixo, para o hall de entrada. Foi então que a jovem viu que se tratavam de 3 homens invasores, todos armados. No entanto, não conseguia ver o terceiro ouvindo-o apenas a gritar com a sua Mãe.
Bich Ha pouco falava inglês e não conseguia perceber as ordens que o homem lhe estava a dar. Tinha-se levantado e Jennifer pediu que voltasse a sentar-se tal como o invasor estava a ordenar, caso contrário, alguém ia magoar-se.

Continuavam a gritar que queriam dinheiro e que não saiam dali sem o dinheiro da Família. Hann disse-lhes ter 60 dólares na carteira mas que os seus pertences valiam muito mais e que levassem o que quisessem mas que não magoassem a sua Família.

Jennifer lembrou-se que, no quarto, os seus Pais guardavam algum dinheiro. Uma sobra de uma viagem aos EUA para um casamento.
Os homens voltaram a levá-la para o quarto dos seus Pais e, seguindo as indicações de Jennifer, apoderaram-se dos 1.100 dólares do casal. Amarraram Jennifer ao corrimão no cimo das escadas e voltaram para junto do casal.

Bateram severamente na cabeça de Hann, vendo o seu sangue a espalhar-se pelo sofá da sala e levaram o casal para a cave. Bich Ha estava incontrolável chorando desgovernadamente, dizendo que podiam fazer-lhes mal mas suplicando que não magoassem a sua Filha.

Hann, no entanto, manteve-se em silêncio. Soube, quase imediatamente, que não se tratava de um simples assalto prevendo o triste destino da sua Família.

Enquanto Jennifer gritava do piso de cima para que a deixassem ir para perto dos seus Pais, um dos homens colocou uma manta por cima da cabeça de Hann e Bich Ha, disparando 2 vezes contra o homem e 3 vezes contra a mulher.

A primeira bala acertou Hann perto do seu olho direito, quase atingindo a artéria carótida e, o segundo tiro, acertou-lhe no ombro direito sendo que a bala saiu disparada pela parte detrás do seu corpo.
Bich Ha foi atingida no pescoço e no ombro direito e, a terceira bala, penetrou e saiu do seu crânio, matando-a instantaneamente.

Jennifer ouviu um deles dizer que era hora de saírem do local, estavam ali há demasiado tempo. Ainda se encontrava amarrada no cimo das escadas mas os agressores tinham deixado a corda frouxa, sendo que a jovem foi capaz de pegar no telemóvel que tinha no bolso das suas calças e ligar para a linha de emergência.

JP - Ajudem-me, por favor! Preciso de Ajuda!
OP - Onde está?

JP - (telefone e morada) Acabámos de ser roubados e não sei onde estão os meus Pais!

OP - Por favor, acalme-se. O que se passa?
JP - Entraram em nossa casa e roubaram o nosso dinheiro todo! E conseguia ouvir os meus Pais a gritar lá em baixo. Por favor, mande ajuda.

OP - Ok, ok. Onde está?

Conseguia ouvir-se Hann, longe do telefone, a gritar por ajuda.

JP - Alguém entrou e ouvi tiros... tipo estrondos. Não sei o que se passa. Estou amarrada cá em cima.

Chamada de Jennifer: https://www.youtube.com/watch?v=O4-mjkS2ABE

Hann, apesar de gravemente ferido, acordou do estado de inconsciência ao lado da sua esposa ensanguentada. Gritou-lhe e abanou-a vezes sem conta mas não obteve resposta. Bich Ha estava morta.

O patriarca estava num estado de agonia indescritível mas conseguiu ouvir a voz da sua Filha no piso superior da casa, o que lhe deu algum alento. Jennifer estava viva.

Apesar dos gritos da Filha, Hann sabia que tinha que pedir ajuda no exterior da residência. Conseguiu arrastar-se pelas escadas até ao piso principal da casa, abrir a porta e rastejar até ao jardim da frente.

Peter Chung, o vizinho do lado, estava a sair para trabalhar quando se deparou com Hann naquelas condições mas já conseguia ouvir as sirenes dos carros da Polícia e da ambulância a aproximarem-se.

Hann foi imediatamente transportado para o Hospital e os Agentes, sem saberem se os agressores estavam ainda no interior da residência, entraram cautelosamente com as suas armas em punho.

O piso principal, com excepção do rasto de sangue de Hann, parecia intocável. Na cave, encontraram Bich Ha já morta. Não havia nada a fazer pela mulher.

No piso superior, no cimo das escadas, estava Jennifer, amarrada à balaustrada mas com um espaço de cerca de 20 cm de corda que lhe permitiu fazer a chamada a pedir ajuda. Apenas o quarto do casal Pan tinha sido completamente remexido e revoltado. O resto encontrava-se no estado normal.

O bairro de Unnionville era maioritariamente residido por Famílias asiáticas. A maior parte dos vizinhos eram familiares ou amigos dos Pan, tendo ficado em completo choque com as notícias daquela noite. Alguns chegaram a declarar não compreender o assalto àquela residência específica. Existiam casas mais abastadas naquele bairro, algumas delas até vazias naquela data, portanto, não fazia qualquer sentido o ataque à Família Pan.

Durante aquele ano, a cidade inteira de Markham tinha registado 6 assaltos mas todos feitos durante a ausência dos habitantes. Com a excepção do desaparecimento de alguns objectos de valor, não existiram crimes mais severos a registar.

Jennifer foi levada para o hospital onde lhe deram medicação para se acalmar. Estava num estado de choque visível mas, fisicamente, não tinha quaisquer ferimentos.

À 1h30 da manhã, enquanto Hann ainda se encontrava numa cirurgia, os Médicos consideraram que Jennifer estava estável, tendo alta e tendo sido levada para a Esquadra da Polícia de Markham.

Ali foi-lhe explicado que não era obrigada a dar qualquer declaração mas Jennifer mostrou-se disponível para contar tudo o que se lembrava de forma a que descobrissem os assassinos da sua Mãe e agressores do seu Pai. Tentou descrever os homens da melhor maneira que conseguiu.

Um deles parecia ser afro-americano, usava luvas pretas de cabedal, tinha rastas mais compridas atrás e curtas à frente, era de estatura média e parecia encontrar-se entre os 28 e os 32 anos.

O segundo era mais alto, usava um lenço escuro a tapar-lhe a parte de baixo da cara e trazia vestida uma camisola com capuz.

Jennifer não conseguia descrever o terceiro elemento sendo que não chegou a vê-lo mas percebeu que tinha uma pronúncia parecida à da Jamaica.

À medida que a entrevista foi decorrendo, a jovem foi-se lembrando cada vez de mais pormenores. Lembrou-se que o homem das rastas tinha gritado a um dos outros para ir buscar mais corda e que tinha sido com essa corda que tinha sido amarrada à balaustrada do primeiro piso. Descreveu o cilindro de uma das armas e conseguiu dar mais detalhes acerca do terceiro homem.

Eventualmente começou a conseguir distinguir as três vozes sendo capaz de explicar o que cada um disse. Ouviu o terceiro elemento na cave a dizer que eles tinham apenas que ter feito o que lhes mandaram, apenas tinham que ter colaborado.

Quando o Detective lhe perguntou por que porta os homens tinham saído, Jennifer disse achar que tinha sido pela porta da frente mas, como não tinha visto, não tinha a certeza. Já em relação ao seu Pai, sabia que tinha aberto aquela porta, porque ouviu-o a arrastar-se até lá enquanto gemia de dor.

O Agente pediu-lhe consentimento para acessar aos registos telefónicos dos últimos 9 dias para que pudessem ter pistas acerca dos perpetradores daquele ataque, bem como da sua localização cada vez que efectuou uma chamada. Jennifer mostrou-se um pouco preocupada pois, segundo indicou, contactava muitas vezes com os seus Professores e Filhos de amigos a quem tinha dado aulas de piano, não querendo envolvê-los no assunto.

O Agente sossegou-a informando que se tratavam de protocolos e que talvez pudessem descobrir alguma informação que os levasse na direcção certa na investigação. Explicou também que não era obrigada a dar-lhes o seu consentimento e, tal como a lei indica, informou que qualquer informação descoberta podia ser usada contra Jennifer. No entanto, sendo também ela uma vítima daqueles homens, não tinha nada a temer.

A entrevista terminou pelas 4h30 da manhã de 9 de Novembro de 2010.

Primeira Entrevista na Polícia, 09 de Novembro de 2010:

https://www.youtube.com/watch?v=4ghE0i8pLYw

Sendo que a casa dos Pan tinha-se transformado no local de um crime, Jennifer ficou a dormir na casa dos seus Tios, a menos de meio quilómetro da sua residência.

A Polícia continuou com a sua investigação, consultando mais de 400 casas no bairro para obter vídeos das câmaras de vigilância e informações acerca da Família que os pudesse ajudar a apanhar os criminosos.

Através das gravações das câmaras de um vizinho, conseguiram visualizar uma viatura a afastar-se da residência dos Pan naquele dia.
Um dos habitantes também informou os Agentes que o ex-namorado de Jennifer já tinha sido condenado por tráfico de droga. A Polícia considerou esta informação importante, podendo o assalto estar ligado a este tipo de criminosos, principalmente, quando tinha existido uma relação pessoal com um membro da Família Pan.

No entanto, não conseguiam perceber por que razão os assaltantes tinham gritado tantas vezes por dinheiro e tinham deixado algum para trás.

Na carteira de Bich Ha encontravam-se 240 dólares, Hann tinha 60 e na de Jennifer estavam ainda 20 dólares.

No dia 10 de Novembro, Daniel Wong, de 25 anos, foi entrevistado pela Polícia.

Já se encontrava na lista das pessoas a interrogar mas, após receberam a dica do seu passado com drogas, passou para o cimo do rol.

O Detective começou por dizer que estavam a entrevistar toda a gente que tivesse tido contacto com a Família nos últimos 10 ou 15 anos e que, por isso, Daniel não tinha sido chamado por nenhuma razão em particular.

O jovem apresentou-se calmo, começando por informar que há quase 2 anos que não se relacionava com Jennifer, a não ser, algumas trocas de mensagens muito esporádicas.

Continuou, explicando que os Pan tinham descoberto a relação entre os dois em 2009 e Hann era completamente contra a relação por achar que Daniel nunca seria capaz de sustentar uma Família e por ter origens filipinas. Explicou ainda que aceitou a decisão da Família da namorada e que decidiu seguir em frente achando que nunca teria um futuro com Jennifer.

No entanto, quando o Agente o confrontou com os registos telefónicos da jovem dos últimos dois meses em que aparecia o contacto dele frequentemente, Daniel contou que Jennifer lhe tinha ligado a dizer que andava a ser ameaçada via telefone por um estranho.

O jovem também estava a passar pela mesma experiência. Recebia chamadas de um número desconhecido e, quando atendia, não ouvia nada a não ser silêncio durante uns segundos e acabavam por desligar a chamada. Quando não atendia, ligavam-lhe dezenas de vezes seguidas. Numa noite chegou a ter mais de 100 chamadas não atendidas. Depois começou a receber mensagens escritas com um tom ameaçador, como por exemplo: "ahhahahah bang bang bang".

Chegaram mesmo a contactar o telefone fixo da sua residência e até a sua Mãe já estava com receio de serem os próximos alvos dos criminosos.
Tinha sido por esta razão que voltou a manter contacto com Jennifer, tentando descobrir quem podia querer fazer-lhes mal ou gozar com eles àquele ponto. Admitiu que as ameaças pudessem ter a ver com as suas actividades relacionadas com as drogas mas não fazia sentido este assunto estender-se a Jennifer já que esta nunca se tinha envolvido com drogas ou com os seus negócios ilícitos.

Daniel descreveu Jennifer como sendo uma prisioneira dos seus próprios Pais, não entendendo as razões dos Pan, já que tinha sido sempre uma aluna exemplar e que, desde pequena, se esforçava para ser a melhor no que fazia.

Enquanto Hann continuava no hospital em coma, no dia 11 de Novembro, pelas 9h30 da manhã, foi Jennifer que voltou à Esquadra a pedido da Polícia para mais um depoimento.

O Detective pediu-lhe que esquecesse tudo o que já tinha contado e que o levasse pelas suas acções daquela fatídica noite.
A jovem voltou a contar a sua versão dos acontecimentos. Tinha jantado com a sua Mãe, depois o seu amigo Adrian apareceu para verem umas séries, subiu ao seu quarto e falou com o amigo Edward com quem se encontrava ainda ao telefone quando ouviu a voz dos invasores e talvez, antes desse telefonema, talvez tivesse falado também com Andrew, um ex-colega de escola. Jennifer voltou a contar a parte dos intrusos e, naturalmente, como acontece à maior parte das testemunhas, acrescentou alguns pormenores e retirou outros em relação ao seu depoimento anterior.

Posto isto, o Detective já estava informado acerca dos problemas entre Jennifer e os seus Pais mas, ainda assim, quis ouvir a versão contada pela jovem.

Jennifer descreveu a sua relação com Daniel, de como teve que a manter escondida dos seus Pais. Um ano e meio antes, já com 23 anos, os Pais voltaram a apanhá-la com Daniel e fizeram-lhe um ultimato: ou saía da casa deles para viver a sua vida como queria ou acabava de uma vez por todas com Daniel e construía o seu futuro. Jennifer escolheu manter-se com a Família. A Mãe da jovem teve, pela primeira vez, uma conversa aberta acerca de sexo com a Filha explicando que, por vezes, bastava um descuido para ter o seu futuro arruinado e que tinha trabalhado tanto para construir uma carreira de sucesso que não era altura de colocar isso em risco por causa de uma paixão. Jennifer voltou a repetir que ia acabar a relação de uma vez por todas, verbalizando apenas o que os seus Pais queriam ouvir.

Mesmo já adulta, Jennifer continuava a ser excessivamente controlada pelos Pais, principalmente por Hann, mas os motivos do casal estavam prestes a revelar-se.

A partir do oitavo ano a situação académica de Jennifer Pan entrou em espiral. Até então, tinha sido uma aluna de excelência mas, naquele ano, não cumprindo as expectativas dos seus Pais, começou a mentir para fugir à desilusão e talvez a eventuais castigos.
Entretanto, a situação descontrolou-se de tal forma que, quanto mais o tempo passava, mais difícil era de abrir o jogo. Aliás, essa hipótese já estava riscada há muito tempo.
Deixou de estudar afincadamente e de prestar atenção nas aulas sendo que passou de uma aluna de 100% para a casa dos 70%, não sendo o suficiente para ingressar no curso de farmacologia.

Em vez de contar a verdade, Jennifer começou a forjar as suas notas usando relatórios de anos anteriores em que cortava, colava e fotocopiava, até conseguir um aspecto suficientemente autêntico para enganar os seus Pais.

Os Pan ficavam orgulhosos cada vez que recebiam as notas da Filha, principalmente, depois de se formar do secundário e de ter recebido a carta que lhe facultava uma bolsa de estudos na Universidade de Reyrson para que posteriormente pedisse transferência para a de Toronto.

Aos olhos dos seus Pais, Jennifer estava a conseguir atingir os objectivos e os sonhos que tinham idealizado para ela. Porém, existiam alguns pormenores que a jovem tinha deixado de fora do conhecimento do casal.

Jennifer Pan nunca chegou a terminar o secundário, muito menos recebeu uma bolsa de estudo para qualquer universidade. Tinha chumbado no último semestre de Cálculo, no último ano do liceu, tendo que repetir a disciplina para conseguir terminar os estudos. Mas não o fez. Continuou com a sua teia de mentiras, preparando o Verão para falsamente ingressar na faculdade. Comprou livros em segunda mão e forjou documentos acerca da bolsa de 3 mil dólares.

Todos os dias, a partir de Setembro de 2008, apanhava transportes para, supostamente, ir para a Universidade ou ia de boleia com os seus Pais que a deixavam à porta do campus. Passava algum do seu tempo numa biblioteca fazendo apontamentos acerca da suposta matéria dada nas aulas e procurava na internet tópicos relacionados com o curso para ter assunto de conversa com os seus Pais.

Por esta altura, Daniel Wong encontrava-se a estudar na Universidade de York e mantinha um part-time na Boston Pizza. Jennifer queimava o tempo da faculdade a encontrar-se com o namorado e também a trabalhar na mesma empresa que Daniel, em part-time.

Quando os Pan mais uma vez viram a sua Filha com Daniel, voltaram a proibir a relação entre os dois e Jennifer disse-lhes o que queriam ouvir. Ia terminar o namoro de vez e concentrar-se apenas nos seus estudos. Porém, manteve a sua vida dupla, saindo de casa todos os dias, supostamente, para as aulas mas, em vez disso, ia trabalhar ou encontrar-se com Daniel.

O jovem sabia das mentiras da sua namorada, ajudando-a a manter a farsa com os seus Pais.

Quando foi altura de Jennifer se formar na Universidade de Toronto, Daniel pediu a um amigo que forjasse o diploma da namorada apenas com notas máximas. Na altura da festa de encerramento, Jennifer explicou aos Pan que eram tantos alunos a formarem-se naquele ano que apenas tinha sido permitido a cada estudante levar um acompanhante. Como não queria decidir entre levar a Mãe ou o Pai, achou melhor fazer-se acompanhar apenas de um amigo, sendo que Hann e Bich Ha não assistiram à formatura da Filha.

Quando disse ter conseguido o trabalho de voluntariado no Hospital de Toronto, Jennifer informou os Pais que tinha que trabalhar por turnos, muitas vezes durante a noite ou mesmo aos fins de semana. Assim, o mais lógico era ficar por casa da sua amiga Topaz que vivia muito perto do Hospital.

Tratava-se de mais uma mentira da jovem. Jennifer, em vez de ir trabalhar no Hospital, passava esses dias e noites com o seu namorado.

Os Pais naturalmente que compreenderam esta ausência da Filha encarando-a como mais um sacrifício para o seu futuro.

Em Setembro de 2009, um ano antes do ataque à residência, Hann deu-se conta que Jennifer não tinha nenhuma bata ou identificação do Hospital de Toronto e, no dia seguinte, insistiu em levá-la ao local de trabalho juntamente com Bich Ha.

Jennifer não se deu imediatamente conta da desconfiança dos seus Pais mas, quando saiu do carro, sentiu a sua Mãe a segui-la. Jennifer entrou no hospital pelas urgências e ali permaneceu durante mais de 3 horas, até ter a certeza que os seus Pais já não se encontravam à sua espera.

No dia a seguir, ainda com desconfianças acerca da conduta da Filha, Hann ligou a Topaz, a amiga de Jennifer com quem esta supostamente ficava várias noites por semana. Tal como receava, foi informado que Jennifer nunca tinha ficado a dormir na casa dela, ficando completamente baralhada com a pergunta de Hann.

Quando Jennifer chegou a casa tinha os seus Pais a aguardá-la ansiosos por explicações. Eventualmente, a rapariga acabou por abrir o jogo ou, pelo menos, parte dele.

Confessou não ser voluntária no Hospital, não ter frequentado a Universidade de Toronto durante os últimos 4 anos e muito menos ter-se formado em farmacologia. Admitiu ainda manter a relação com Daniel e ficar em casa da sua Família entre todas as segundas e quartas feiras afirmando já fazer parte dos Wong e ser bem aceite pelos Pais de Daniel.

Os Pais de Daniel tinham sido informados que os Pan concordavam com a estadia da Filha com eles em Toronto e insistiram com Jennifer para conhecer os Pan, contudo, tanto ela como Daniel acabavam sempre por dar uma desculpa.

Hann e Bich Ha estavam furiosos com as mentiras de Jennifer. Hann quis mesmo expulsar a Filha de casa. Sentia que não a conhecia, não sabia quem era aquela jovem à sua frente, não tinha sido assim que a tinham criado, era uma desgraça para a sua Família, uma vergonha.
Foi Bich Ha que convenceu o marido em deixá-la ficar mas, para isso, Jennifer tinha que candidatar-se à Universidade de Toronto para efectuar o curso de farmacologia. Sendo que tinha os créditos da faculdade de Ryerson, não devia haver grande problema para que conseguisse ingressar naquele curso. Não era tarde demais.

Jennifer tinha tido a oportunidade para ser totalmente sincera com os seus Pais, ainda assim, escolheu ser apenas parcialmente honesta mantendo uma parte da sua farsa. Nunca tinha frequentado Ryerson, até porque não tinha terminado o liceu.

A partir deste episódio, a cerca à volta de Jennifer ficou ainda mais apertada. Não tinha permissão para sair de casa sozinha. Ficou sem o seu telemóvel e portátil e apenas pôde manter as aulas de piano que dava em casa a alguns Filhos de amigos.

Fizeram as contas ao dinheiro que lhe tinham dado, supostamente, para manter os estudos e portanto, esse valor tinha-se tornado em dívida para com eles e Jennifer estava obrigada a pagar-lhes tudo de volta.

Eventualmente, Hann e Bich Ha descobriram que a Filha nem sequer tinha terminado o secundário, obrigando-a a repetir as aulas de Cálculo e a terminar o liceu para que conseguisse recuperar e assim ingressar na faculdade como estava há tantos anos assente.

À medida que foi recuperando a confiança dos seus Pais, pôde utilizar o telemóvel ainda que com horários restrictos mas, mesmo assim, os seus movimentos e mensagens eram frequentemente monitorizados. Por vezes, era-lhe permitido sair de casa sozinha mas tinha que estar de volta antes das 21h00 e os quilómetros feitos no carro que lhe emprestavam eram apontados e controlados.

Jennifer, mesmo assim, não desistiu de Daniel continuando os encontros às escondidas. Pedia a um amigo, Gary, que a fosse buscar a casa, a deixasse em casa do namorado e depois lhe desse boleia de volta. Chegou mesmo a sair às escondidas durante a noite, deixando a cama arranjada de forma a parecer que estava deitada a dormir mas, eventualmente, Bich Ha descobriu.

Naturalmente que a liberdade que entretanto tinha conquistado, voltou a perder-se, voltando a ficar sem telemóvel e sem saídas à rua sozinha.

Daniel Wong ficou farto de não conseguir manter uma relação normal com Jennifer e, no final de 2009, acabou a relação iniciando um namoro com outra rapariga, Christine.

Quando Jennifer descobriu ficou possessa. Estava apaixonada e queria Daniel só para si, tendo que arranjar forma de chamar a sua atenção.

No início de 2010, conseguiu contactar Daniel dizendo-lhe que a residência tinha sido invadida por 3 homens na ausência dos seus Pais e que tinha sido violada pelos 3 estranhos. Sabia que tinha sido Christine a encomendar aquele crime como aviso para se manter longe do seu ex-namorado. Estava também a receber ameaças por telefone e chegou mesmo a receber uma bala pelo correio.

Na segunda entrevista de Jennifer com a Polícia, a jovem acabou por admitir as suas mentiras, incluindo a violação, o recebimento da bala pelo correio, as ameaças de morte através do seu telemóvel, bem como todas as farsas em relação aos seus estudos.

Segunda Entrevista de Jennifer na Polícia, 11 de Novembro de 2011:

https://www.youtube.com/watch?v=VaVD1XwNvz8&t=856s

As suspeitas cresciam em relação à jovem mas os Detectives mantiveram a fachada de solidariedade em relação àquela suposta vítima. Tentaram deixá-la confortável sublinhando o facto do seu nervosismo ser normal naquelas circunstâncias e que, provavelmente estava a sofrer de complexo de sobrevivente. Foi também informada de que tinham especialistas à sua disposição para a ajudarem a ultrapassar esse sentimento.

O Agente colocou a possibilidade do crime poder estar ligado a pessoas envolvidas com Daniel por causa das drogas e negócios ilícitos e que, ainda que Jennifer alegasse não ter qualquer envolvimento com aquela parte da vida do namorado, talvez fosse possível que as pessoas envolvidas não encarassem o assunto da mesma maneira. Talvez tivesse sido uma vingança de pessoas envolvidas com Daniel.

Jennifer não negou nem confirmou, provavelmente com o intuito de deixar essa dúvida com a Polícia. Podia ser que assim a investigação seguisse na direcção errada.

Mas a entrevista foi ficando cada vez mais dura. O Detective esmiuçou as mentiras da jovem, os problemas com os seus Pais, um possível ressentimento em relação a eles. Afinal, talvez tivessem sido eles os causadores do fim do seu namoro com Daniel. Talvez Jennifer os culpasse por esta perda e, talvez, fosse ela a responsável pelos acontecimentos.

Jennifer mostrou-se chocada, negando esta possibilidade e alegando que, caso Daniel fosse mais importante, podia ter saído de casa e ir viver com ele, contudo, tinha escolhido permanecer com a sua Família.

Foi-lhe ainda perguntado por que razão ela achava ter sobrevivido. Afinal, os seus Pais tinham sido executados ou, pelo menos, tinha sido essa a intenção dos assassinos, já que Hann ainda se encontrava em coma no Hospital. Jennifer disse que o homem das rastas a informou que apenas a deixava viva porque tinha cooperado.

Perguntou-lhe ainda inúmeras vezes se, durante as entrevistas, Jennifer tinha mentido em algum momento mas a jovem anuiu ter feito tudo o que podia para ajudar.

No dia 12 de Novembro de 2010, Hann Pan acordou no hospital do seu coma induzido. Era o seu irmão quem estava na cabeceira da cama e que o colocou ao corrente do que se tinha passado e estava ainda a passar, nomeadamente, da morte do seu sogro uns dias antes.

Mas Hann, para além dessa informação, não precisava que ninguém lhe dissesse o que se tinha passado. Lembrava-se de tudo. Lembrava-se dos invasores, da morte da sua esposa e, especialmente, do comportamento da sua Filha naquela noite.

Foi por ter a certeza de que Jennifer estava envolvida nos acontecimentos daquele serão que decidiu não subir as escadas para ir ao seu encontro, optando por abrir a porta da frente e tentar pedir ajuda no exterior da residência.

Assim que a Polícia soube da notícia visitou-o imediatamente para obter informações acerca do dia 8 de Novembro de 2010.

As Autoridades proibiram Jennifer de visitar o Pai antes de lhe fazerem uma visita. Porém, não era necessária a proibição por parte dos Agentes. Hann não queria olhar para a cara de Jennifer deixando bem claro à Polícia de que a sua Filha estava envolvida naquele caso.

Contou todos os movimentos daquela noite e a versão de Hann não coincidia com a de Jennifer. Lembrava-se perfeitamente que os criminosos tinham sido agradáveis com a jovem, praticamente amigáveis e que Jennifer tinha correspondido às simpatias. Também não tinha sido amarrada. Enquanto Hann e Bich Ha estavam na sala e tinham sido posteriormente levados para a cave, Jennifer passeava livremente no interior da residência a assistir a todas as agressões.

Apesar das suspeitas que os Agentes já tinham sobre Jennifer, ficaram chocados com a confirmação deste Pai em sofrimento.

No dia 22 de Novembro, Jennifer foi novamente chamada à Esquadra para depor mas, desta vez, enquanto suspeita e não como testemunha. Foi informada desse facto e, após todas as formalidades dos seus direitos, advogado, etc. foi novamente interrogada. Desta vez era um especialista em comportamento que estava a questionar Jennifer.

Começaram por falar da personalidade de Jennifer e dos seus passatempos. Depois passaram para a relação com Daniel. Ficou claro que a jovem não sabia muito bem como se encontrava o seu namoro com o rapaz. Daniel, por vezes, mostrava-se interessado em construir um futuro com ela mas, no dia a seguir, dizia exactamente o contrário.
Depois falaram acerca das suas mentiras, da relação com os seus Pais e, finalmente, da noite dos crimes. A jovem contou a sua versão, mais uma vez, acrescentando pormenores e retirando outros até que, depois do interrogador sair da sala por alguns momentos, voltou com o seu veredicto. Sabia que Jennifer estava a mentir em relação à timeline daquele serão e sabia que estava envolvida com os criminosos.

No entanto, com o intuito de obter uma confissão, mostrou-se solidário com "o erro" que Jennifer tinha cometido, dizendo que toda a gente comete erros, estamos todos sujeitos a cometê-los mas depois temos que tirar esse peso do nosso peito.
Compreendia perfeitamente de como se devia sentir em relação aos seus Pais. Tinha 25 anos e estava a ser tratada como uma miúda de 15. Tinha feito algumas asneiras? Claro que sim mas todos fazemos asneiras e talvez os seus Pais exagerassem nos castigos e na falta de liberdade que lhe davam.

Era uma jovem a querer viver a sua vida e os seus Pais estavam a impedi-la de o fazer mas sabia que, apesar de ter tido aquele deslize, era uma boa pessoa e portanto, para o provar, tinha que contar a verdade. Mas Jennifer não facilitou a vida aos investigadores continuando a alegar a sua inocência.

Três meses antes da invasão à casa dos Pan, na Primavera de 2010, Jennifer contactou o ex-colega da escola primária, Andrew Montemayor. Confidenciou-lhe que a sua vida era um inferno por causa dos seus Pais. Andrew compreendeu a dor da sua amiga pois, também ele, em tempos, tinha desejado a morte do seu Pai.
Ainda que a conversa não tivesse sido demasiado séria, foi o suficiente para que Jennifer começasse a idealizar a sua vida sem Hann a controlá-la. No Verão desse ano, começou a planear pormenorizadamente o que fazer para eliminar o patriarca voltando a contactar Andrew acerca do assunto.

O jovem apresentou-lhe o seu colega de quarto, Ricardo Duncan e ambos combinaram que Ricardo ia assassinar Hann no parque de estacionamento da fábrica onde trabalhava.

Jennifer deu-lhe 1.500 dólares que tinha conseguido juntar com as lições de piano como adjudicação do trabalho e ficou de o contactar mais tarde para acertar pormenores. No entanto, a partir dessa data, Ricardo nunca mais atendeu o telefone nem nunca mais deu a cara.

Jennifer virou-se então para o seu namorado que, devido aos seus conhecimentos no mundo das drogas, conhecia alguém disposto a executar o assassinato. Tratava-se de Lenford Crawford, mais conhecido como Homeboy.
Daniel colocou ambos em contacto permanente, dando um telefone novo a Jennifer para usar apenas para este fim. Lenford, contudo, precisava de ajuda pois Jennifer já não pretendia apenas matar Hann mas também a sua Mãe Bich Ha.

Crawford subcontratou 2 amigos, David Mylvaganam e Eric Carty para o ajudar a executar o trabalho.

O pagamento era de 5.000 dólares por Bich Ha e outros 5 mil por Hann.
Jennifer entregou-lhes uma pequena quantia de dinheiro, sendo que, no dia da invasão, recolhiam 2 mil dólares que a jovem tinha no seu quarto e o resto do pagamento seria entregue após receber o seguro de vida dos seus Pais.

Sendo Jennifer a ajudar a sua Mãe a organizar os impostos e as finanças da Família, a jovem tinha conhecimento do valor do seguro de vida dos seus Pais. Tratava-se de quase 1 milhão de dólares que, dividindo com o seu irmão Felix, era mais que suficiente para adquirir uma casa, reconquistar Daniel e fazerem a sua vida juntos.

Combinou os assassinatos para dia 2 de Novembro mas, pouco antes dessa data, Daniel mandou uma mensagem a Jennifer a dizer-lhe que tinha seguido com a sua vida com outra jovem e que, portanto, já não pretendia construir um futuro com Jennifer.

A jovem ficou destroçada pedindo a Daniel que cancelasse os planos com Homeboy. Daniel respondeu-lhe que pensava que ela estava a fazer aquilo por ela e não por ele. Jennifer realmente concordou, no entanto, depois dos homicídios não tinha para onde ir.

Depois desta conversa, a jovem recebeu uma mensagem do assassino contratado a pedir-lhe a data pretendida para os acontecimentos. Propôs-lhe o dia 2 de Novembro mas os Pan tinham planos para irem jantar fora e, por isso, não iam estar em casa.

No dia 8 de Novembro, Crawford enviou uma mensagem a Jennifer a informá-la que seria naquele dia após o trabalho.

Entre as 16h30 e as 22h25, Jennifer e Andrew trocaram mais de 100 mensagens, falando também ao telefone. O rapaz não estava envolvido neste plano mas a jovem contou-lhe o que estava prestes a acontecer mas Andrew desvalorizou. Apesar de lhe ter apresentado Ricardo apenas uns meses antes para ser ele o autor dos crimes, nunca pensou que ela fosse capaz de perpetrar um crime tão horrendo.

Às 18h12 Jennifer recebeu um telefonema de Crawford a dizer que ia seguir com o plano.

Às 21h00 daquele dia, David Mylvaganam e Eric Carty encontraram-se no sítio onde arrendaram um carro, apanhando Lenford Crawford pelo caminho.
Às 21h35, David contactou Jennifer a informar que estavam a chegar.

Jennifer desligou a chamada e, às 21h45, foi ao piso de baixo onde cumprimentou a sua Mãe, dirigiu-se à porta principal da casa e destrancou-a conforme combinado.

Às 22h02 foi ao escritório, localizado ao lado do quarto dos seus Pais, acendeu a luz por alguns segundos e tornou a apagá-la. Era o sinal para os criminosos.

No dia 22 de Novembro, data da sua terceira entrevista na Esquadra da Polícia, Jennifer Pan foi detida sob as acusações de homicídio em primeiro grau, tentativa de homicídio e conspiração para cometer homicídio.

A Polícia tinha o suficiente para provar a culpa da jovem pela morte da sua Mãe e tentativa de assassinato do seu Pai mas Jennifer, apesar de todas as evidências, não confessou. Pelo contrário. Inventou uma história em que era ela que devia ter sido morta. Quis suicidar-se mas não queria que a sua Família passasse por esse sofrimento e vergonha e, por isso, contratou assassinos para a matarem.

Eric já se encontrava na prisão devido ao seu envolvimento noutro homicídio em 2019, tendo sido David o primeiro a ser detido devido ao seu envolvimento neste ataque.

No dia 26 de Abril de 2011, foi Daniel Wong que foi preso na Boston Pizza onde ainda trabalhava. Duas semanas depois, foi a vez de Lenford Crawford-

Estavam todos acusados de homicídio em primeiro grau, tentativa de homicídio e conspiração para cometer homicídio.

O julgamento começou apenas no dia 19 de Março de 2014 e durou cerca de 10 semanas. Apesar de estarem a ser julgados ao mesmo tempo, o Juiz deixou claro que as suas sentenças podiam ser diferentes consoante o que ficava provado em Tribunal.

Nunca chegaram à conclusão de quem tinha premido o gatilho, no entanto, todos eram culpados, todos faziam parte do plano, portanto, todos eram assassinos.

A Defesa de Jennifer alegou que os seus planos eram para o seu suicídio/homicídio mas que Lenford Crawford era um psicopata não aceitando que Jennifer tivesse cancelado o combinado à última da hora e, por isso, tinha morto os seus Pais.

Depois, já que David se encontrava a cumprir prisão perpétua, tentaram colocar as culpas apenas nele.

No início do julgamento, David estava presente com o seu Advogado mas, por questões de saúde, o Advogado não pôde comparecer mais em Tribunal e David foi retirado do caso, tendo sido julgado separadamente mais tarde.

O Júri demorou 4 dias a deliberar, chegando a um veredicto no dia 13 de Dezembro de 2013.

Jennifer Pan, Eric Carty, Daniel Wong e Lenford Crawford foram considerados culpados pelo assassinato de Bich Ha Pan e tentativa de assassinato de Hann Pan.

Hann não quis ler o seu discurso de impacto de vítima pessoalmente, tendo sido uma protecção de testemunhas a fazê-lo:

"Quando perdi a minha Esposa, também perdi a minha Filha ao mesmo tempo. Não sinto que tenha uma Família.

No dia em que Bich Ha morreu, eu morri também. A minha vida mudou completamente naquele dia.

Alguns dizem que devia sentir-me sortudo por ter sobrevivido mas eu sinto-me morto. Já não consigo trabalhar devido aos meus ferimentos e desisti das coisas que mais gostava de fazer como jardinagem, arranjar carros ou ouvir música. Já não tenho nenhuma satisfação nisso.

Sinto muito a falta da minha Mulher. Ela conhecia-me com ninguém e gostava de mim. Sinto-me muito só sem ela. Estávamos casados há quase 30 anos. Bich Ha era uma boa Esposa e uma boa Mãe, punha sempre as crianças em primeiro lugar e era raro gastar um tostão nela própria. Amava música e amava dançar. Tomava conta das crianças enquanto eu trabalhava.

Sempre quis ir ao Vietname e eu sempre lhe disse que devíamos investir na educação dos nossos Filhos primeiro. Mas, quando eles terminassem os estudos, podíamos focar-nos em fazer o que queríamos. Mas essa altura não chegou para ela.

Não encontro qualquer alegria em fazer férias. Sinto-me sempre triste e sozinho. Às vezes, quando estou com os meus amigos, finjo estar feliz. Na realidade, tenho dificuldade em não sentir ciúmes das suas Famílias e da sua felicidade. A minha única esperança é que Felix case e me deixe ir viver com ele.

Neste momento, vivo com 2 irmãs e com a minha Mãe já velhinha porque não suporto viver na minha casa devido às más memórias do que ali se passou. Há reparações que são necessárias naquela casa mas, devido aos meus ferimentos, não consigo executá-los. Não gosto de lá ir a casa porque os meus vizinhos perguntam-me o que se passou e eu sinto-me envergonhado.

Não consigo vender a casa porque se encontra num bairro asiático e existem superstições por causa do homicídio.

Não consigo dormir de noite e tenho pesadelos constantes acerca da noite em que fomos alvejados. Sinto pânico a toda a hora, especialmente se vir um grupo de jovens na rua. Não sou racista mas homens negros assustam-me se os vir num grupo. Sinto muitas dores e tomo medicação para as dores todos os dias. Não tenho apetite já que não sinto prazer com a comida pois sei que jamais vou voltar a provar os cozinhados da minha Esposa. Estou também a tomar medicação para os diabetes e colesterol porque não consigo fazer exercício físico, já que é demasiado doloroso.

A minha vida mudou totalmente.

Visito a campa da minha Esposa com o meu irmão e cunhada no aniversário da sua morte e em datas especiais e é sempre doloroso relembrar como ela morreu e naquilo em que a minha vida se tornou. Sou uma pessoa solitária e não tenho ninguém com quem partilhar os meus sentimentos, já que o meu Filho Felix não quer falar do assunto, apenas esquecer o que se passou.

É muito difícil para o Felix. Não quer ouvir o nome da irmã e não quer saber o que se passou em Tribunal. O Felix afastou-se muito e tornou-se uma pessoa muito diferente do que era. Não quer falar sobre a Família e tornou-se muito fechado, distante e muito triste. Ele diz que não quer recordar-se e não quer procurar por um emprego em Toronto porque sente que o nome da Família ficou manchado, porque toda a gente tem conhecimento do assassinato da Mãe.

Espero que a minha Filha Jennifer pense no que se passou com a sua Família e possa tornar-se numa pessoa boa e honesta, algum dia."

Todos os acusados foram sentenciados a 25 anos de prisão sem possibilidade de condicional com excepção de Eric.
Sendo que já estava a cumprir uma pena perpétua, fez um acordo para evitar ir novamente a julgamento e foi sentenciado a mais 18 anos de prisão.

As últimas palavras de Bich Ha foram a sua súplica para que não fizessem mal à sua Filha. Que podiam fazer tudo o que quisessem com ela e Hann mas que não magoassem Jennifer.